segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
O mundo do conhecimento e o conhecimento do mundo
Uma questão fundamental é saber se já carregávamos em nós o conhecimento ou se o conhecimento vem das nossas sensações, do nosso contato com o mundo. Se o conhecimento está em nós temos meio caminho andado para a autonomia de nosso eu. Contudo o nosso eu interior responde apenas por uma parte do conhecimento, são as estruturas que herdamos. Para conhecer temos que sentir, ter contato com o mundo exterior. E no mundo exterior está o outro. E esse outro nos contamina porque antes do contato tínhamos certeza do que sabíamos, como sabemos a hora quando temos um relógio e quando temos dois já não mais sabemos. Não temos mais certeza de quão real e exata é a nossa visão de mundo e nem onde acaba a fronteira da visão do outro e começa a nossa. E essa diluição de fronteiras afeta o conhecimento de nós mesmos e expõe a fragilidade dos seres pensantes que somos, esses "eus" e "outros" imersos na alteridade.
A alegoria da caverna de Platão coloca nossa experiência da realidade como seres acorrentados que enxergam sombras. Por outro lado existe um conhecimento ideal que só obtém quem sai da caverna e retorna. No entanto quem acreditou desdenha desse conhecimento. O conhecimento ideal é o conhecimento do eu, um conhecimento sem as manchas da presença do outro. Nós enxergamos sombras e as discutimos com o outro, um jogo em que mais uma vez incorporamos a visão imperfeita do outro no lugar de uma visão ideal. Nossa realidade são essas sombras e nela estamos imersos com o outro e a ele inevitavelmente vinculado.
A discussão de alteridade em confronto com a identidade pode ser vista num cenário histórico. Para Vico a história do homem é cíclica e abrange três idades: dos deuses, dos heróis e dos homens. Na idade dos deuses os homens crêem estar sob governo divino, crendo assim em deuses e oráculos e nasce a religião. Na idade dos heróis são criadas as repúblicas aristocráticas e surge uma linguagem de caráter mítico e poético. Na idade dos homens surge a razão e o domínio da linguagem e essa é a idade onde estamos. O eu e o outro não são relevantes na idade dos deuses e a invenção característica da idade dos heróis dissipa as tensões que há na fronteira entre esses dois sujeitos. No entanto a razão leva esses sujeitos a construírem interpretações da realidade. E a linguagem possibilita a veiculação dessa interpretação, sendo que o eu e outro não chegam a uma interpretação única, contaminam a sua interpretação um com a do outro e sonham com o retorno à idade dos deuses.
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3 comentários:
Sartô, você já leu Hegel? Ele aborda de uma maneira interessante a dialética entre o eu e o outro. Veja por exemplo em Introdução à Filosofia da História.
Abraços
Edson
Estou há algum tempo lendo a "Fenomenologia do Espírito", uma texto nada fácil (creio que Hegel é um dos filósofos com um texto intricado, que exige o acesso ao original alemão)
Obrigado pela sugestão.
[]'s
Alexandre
Eu sou eu, você é você realmente é um lugar comum do bem estar.
Mas eu me colocar no lugar de você é uma chave para o relacionamento interpessoal. Tanto quanto como eu/nós me coloco/nos colocamos no lugar dos "outros" está na matriz do tecido social.
Então não existiria lei/comportamento mais importante/antigo dos seres humanos que a reciprocidade. Eu sou eu, você é você e nós somos nós... mas quem seriam os outros?
[]´s JP
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